Minha tia Fernanda tem uns 8 anos a mais do que eu, acredito. Depois de alguns meses de regime anti-paternal, acabei entrando em contato com o procriador que por me fazer foi (irres)responsável. Acabei trazendo pra casa aquela bagabem de passado e alguns cheiros dos meus anos antes dos 10. Os tempos em que eu era uma criança idiotinha.
Fernanda, ou Lala, foi quem me deu toda a base de qualquer tipo de educação musical, teatral e acadêmica. Graças a ela, e a caixas de feira enfileiradas em uma sala externa da antiga casa da minha vó, eu aprendi a ler aos 4 anos. Por consequencia, li todas as revistas Capricho (na época em que elas falavam sobre alguma coisa além de imbecilidades para meninas de 13 anos), e aprendi como funciona a cabeça de uma mulher devorando todas as Novas e Cláudias da minha mãe (talvez por isso preferi me relacionar sexualmente com homens, depois de descobrir o labirinto em qual eu ia me meter. Pura ilusão. É mais fácil entender a cabeça de uma mulher do que a cabeça de um homem, já que a maioria, não deixo de me incluir, pensa mais com a de baixo, fato.)
Fernanda brigava com a mãe, batia na mãe, e a mãe batia nela. Fernanda foi flagrada com maconha no guarda-roupa, Fernanda era meu herói. Imitava a Xuxa, era apaixonada pelo Sebastian Bach (toda vez que vejo ele com suas luzes, plásticas e gritinhos em Gilmore Girls, aquelas mariposas do estômago fazem uma festa em homenagem a nostalgia). Com ela, assisti todos os filmes do Leonardo DiCaprio na época do frisson de Titanic. A Praia de madrugada, comendo um strogonoff que não era strogonoff. Lembro de uma travessa com batata palha e alface. Só.
A Fernanda me subiu no sótão de casa, me ajudando a escalar uma porta e subir com a maior dificuldade. Minutos depois, eu chorava por não conseguir descer, e ela me trazia um pode de margarina vazio cheio de água com açúcar. Quase me acalmei, até o heróico salvamento do meu super pai. I try hard to have a father, but instead I had a dad.
Fernanda era skatista e me emprestava seus tênis batatões, suas calças largas e sua revolta adolescente, que em mim aflorou aos 9 anos. E dentro de mim ficou, vendo todas as críticas de toda a família em relação a ela. Fernanda engravidou aos 19. Escondeu a gravidez até o 9º mês. Só minha vó 'não sabia'. Fernanda andava com os caras do mal, tinha piercing, cabelo roxo, paredes pichadas e lia Christiane F. Fernanda era drogada, e diziam, prostituída.
Uns anos atrás encontrei Fernanda. Pôs silicone, alisou o cabelo. Sua filha anda como uma boneca. Se casou com algum filho de deputado (ou seria dono de despachante!?). Toda montada em roupas de marca. Toda alisada. Loira. Peituda. Dentes brancos, perfeitos. Casada.
Uns dias atrás encontrei Fernanda. Trabalhando no caixa de um super-hipermercado. Morando numa kitinet. Com olheiras, o alisamento mal feito. Empolgada em conversar, e eu num dia não tão legal de mim mesmo, nem dei muita atenção.
Minha heroína ou não, meu (anti) exemplo, Fernanda se reflete em mim todos os dias. Deus do céu se minha mãe percebe isso.
quinta-feira, 26 de novembro de 2009
Assinar:
Postar comentários (Atom)
O tempo é carrasco. Ou seria a maturidade?
ResponderExcluirÓptimo te ler por aqui, traveiz...
Bohemia
ResponderExcluirA mocidade afoga suas mágoas, bebem gotas de abismo em cálices de marfim
Travo um duelo contra a insonia,
Que mais uma vez me leva à lona
A alvorada seu regresso não trouxe, procuro por você nesses amores decadentes
Na rua da saudade sigo a trilha qeu seus passos deixaram,
Procuro-te no livro que li, no poema que escrevi
Em cada corpo sem rosto, no aperto de mão frouxo
No abraço vazio que teus braços não trazem
Encho a cara com a mais barata dose de tédio,
Me afogo na ressaca de acordar mais um dia sem você
Quero um passe de mágica, tirar você da cartola
Com um "abracadabra" fazer a solidão desaparecer
Eu poeta de minhas dores, nas linhas de cada verso, traços de meus devaneios;
Bebi da poção dos tolos, pensei que fosse mel, o néctar dos céus
Ou o fatal e leviano veneno que velou Romeu e Julieta
Salvo engano, acabei me apaixonando...